O meu wall do facebook foi invadido por mensagens de raiva face à greve geral e aos selvagens do século passado que a ela aderiram. Como decidi participar na paralisação e me considero um tipo relativamente civilizado, não consigo resistir a comentar alguns pontos em que me parece haver injustiça de argumentação.
As pessoas em greve perdem um dia de salário. As pessoas em greve que cumprem serviços mínimos, como os médicos, perdem o salário e trabalham à mesma, porque fazem questão de formalizar a adesão à greve. O impacto pernicioso no PIB e na produtividade é um mito, porque a esmagadora maioria das empresas que conta para o PIB recupera a produção noutros dias. Provavelmente a produtividade aumenta em muitas empresas porque a produção se mantém e a carga salarial das empresas desce.
Há pessoas, como eu, que não fazem greve porque um sindicato ou um partido lhes diz para fazer greve. Fazem-no porque têm a convicção profunda de que as opções que estão a ser tomadas a nível europeu, com reflexos imediatos nos decisores nacionais, estão erradas. Que pensam que qualquer ajustamento financeiro tem de ser feito em prazos e em condições que não ponham em causa as bases do funcionamento da economia, da sociedade e da democracia. Infelizmente, não é possível participar nos actos eleitorais alemães ou franceses, e o Banco Central Europeu nem sequer tem dirigentes eleitos. Não me lembro de nenhum programa eleitoral que, nas últimas eleições legislativas em Portugal, referisse que, através de cortes em subsídios de Natal e de férias, iria haver funcionários públicos e pensionistas com reduções de rendimentos superiores a 30% ao longo do programa de assistência económica. A greve acaba por ser o mecanismo que resta para mostrar esse descontentamento. Mesmo que não mude nada a curto prazo, serve como simbolismo.
Não faço ideia se a greve faz com que haja mais gente em esplanadas ou em centros comerciais. No meu caso, vou ficar em casa a ler dois ou três textos sobre economia. Como o principal motivo para a falta de competitividade do país é a falta de qualificações dos trabalhadores, acho que é um bom contributo para fazer subir o PIB.
1 - Independentemente da pergunta sobre a crise actual, explicar que os portugueses viveram acima das possibilidades.
2 - Referir que isto significou uma quantidade absurda de gente a recorrer a crédito para passar férias em estâncias de luxo, comprar Bimbys de sétima geração ou plasmas de três metros quadrados.
3 - Concluir que os portugueses não podem continuar a viver acima das possibilidades.
4 - Quando questionado sobre o facto de mais de 80% do endividamento dos portugueses ter servido para comprar habitação, alegar que viver numa casa é uma aberração sumptuária. Neste ponto da argumentação, acrescentar que as famílias vivem numa orgia de consumo porque bebem iogurtes líquidos de manhã.